.. ...
ANALISE
REICHERT BORNGRABER - PY3AVE
WALTER
BORNGRABER - PY3AIG
NOS MUITOS QTC's DESTE CASAL ESTÁ
UMA LIÇÃO DE HUMANISMO
A
menor peça de um apartamento da Cristóvão Colombo. Aquele
quartinho que nos anúncios de imóveis diz que é para a empregada.
Muita gente usa para botar as bugigangas. Mas é num cubículo
destes que dona ANALISE REICHERT BORNGRABER instalou seus
equipamentos. É a única mulher, no Rio Grande do Sul, radioamadora
em constante atividade. Quando necessário, o Brasil inteiro sabe.
Os colegas logo informam que a PY3AVE é uma senhora que não mede
esforços para quebrar qualquer galho. Dedica todo seu tempo livre
ao radioamadorismo. Para a prestação de serviços e para o papo
amigo. Tudo naquela pecinha de um metro por dois. “A peça não
precisa ser grande para fazer uma boa ação”.
Pois
na Cristóvão Colombo, 878 - apartamento 5, é que dona Analise
opera com o “Geloso” em 80 e 40 metros, com o “Collins
KWM2”, em 20 metros. Aí vai ao ar uma voz clara e segura pra
dizer “PY3AVE, com bom dia na freqüência”. Ou então “boa
noite”, que para Dona Analise não tem hora especial. Sempre que
pode liga os aparelhos. Fica “corujando”. É caso grave, dá
para ajudar, intervém na conversa e oferece seus préstimos. Não
raro leva para a salinha o tricô ou crochê, que dá para fazer as
duas coisas. Trabalhar com as linhas e agulhas e entrar na famosa
“rodada da amizade”. Isto de manhã ou de tarde. À noite, fica
na escuta ou falando, como membro da “patrulha da madrugada”. O
negócio entra madrugada dentro e dona Analise fica firme para o que
der e vier. Pode surgir um chamado urgente, algo que esteja ao seu
alcance. Pode entrar na sua freqüência alguém que queira trocar
umas palavras.
“Se
é pra passar as noites em claro, não há problemas. A gente esta
no radioamadorismo é pra ajudar a quem precisa.” Foi assim que
dona Analise não descansou enquanto não estourou um “QTC”
vindo de Buenos Aires. Precisava localizar uma pessoa em Caxias.
Falou com a central telefônica de lá. Entrou em contato com um
motorista de táxi. A pessoa foi localizada. Outra vez foi uma família
paulista que estava viajando pelo Rio Grande do Sul. Acontece que
uma das crianças, pouco antes da viagem, foi mordida por um
cachorro. Dona Analise se comunicava todos os dias com São Paulo e
informava à família, que andou pela serra e litoral. Por segurança
tinha que se constatar se o cão estava ou não raivoso. Depois de
24 dias de ligações, dona Analise e seu esposo foram a Capão da
Canoa tranqüilizar a família. A criança não corria perigo.
Passados os dias críticos, o animal não mostrou sinais de raiva.
Em
todos os casos, seu Walter, o esposo, toma parte. Também é
radioamador, associado da LABRE, com prefixo PY3AIG. “Ele é técnico
em eletrônica, nascido na Alemanha, e tem todo o bom humor germânico.”
Um gozador: “Quando os aparelhos não apresentam defeitos, a
Analise diz: - não mexe nos meus transmissores”. - quando estão
com alguma falha, - Walter, faz
favor de consertar os teus aparelhos.”
Muito
alegre o casal. Desses que não pagam imposto pra rir com vontade. Desses
que a gente tem impressão que conhece a muito tempo. É por isso
que não há radioamador brasileiro que não conheça Analise e
Walter. Já tiveram muitas demonstrações de carinho no
radioamadorismo e sorriem satisfeitos quando relembram. Ultimamente
o seu Walter não opera muito. Gosta é de pegar o “Collins” e
falar a longa distância. Um caçador de figurinhas difíceis. Já
dona Analise se contenta em ficar no “Geloso”. Sua faixa de atuação
é todo este Brasil. Tem bom ouvido para gravar os sons e conhece a
maioria dos amigos pela voz. Gosta de participar das rodadas. Uma
radioamadora “munheca”.
Agora,
na hora do pega, do pedido urgente, os dois trabalham parelhos. Já
perderam a conta dos QTC's que estouraram. Muita vez, depois de um
serviço prestado, aparece gente querendo saber “quanto custa”.
Aí eles explicam que radioamadorismo é isso mesmo. Que a dedicação
não tem preço, mesmo que tenham gasto com táxis ou viagens. Que
para eles é uma espécie de sacerdócio voluntário. Que, na
maioria dos casos trabalham unidos.
Estão
casados há trinta anos. É com a mesma união e ternura que falam
da filha que é casada e da outra, recém formada em
biblioteconomia.
Dona
Analise, com o marido cobrão em eletrônica, desde os primeiros
anos de casada se interessou pelo radioamadorismo. Muito antes de
pensar em fazer testes, já dava as suas corujadas. No início não
dava porque as meninas ainda eram pequenas. Em 56, fez exames para
ganhar o prefixo. Rodou na primeira “que saber Código Morse é
brutal”. Mas venceu a força de vontade - vontade de ser útil aos
outros - e recebeu o novo nome, PY3AVE. Um prefixo que lembra uma
mulher que sempre tem uma palavra de conforto. Alguém cheio de
calor humano e em quem se pode confiar cegamente. “Nunca tive
decepções sendo uma das poucas mulheres radioamadoras. Ao contrário,
me sinto realizada. Foi no radioamadorismo que encontrei os melhores
amigos. Às vezes meu marido viaja e minha filha sai com as amigas.
Não me sinto só”. É que dona Analise vai para sua salinha, gira
um botão e, pronto. Sempre é bem recebida nas rodadas. Conversa
com um amigo de Corumbá, São Paulo ou Cachoeira como se fosse um
membro da família.
Além
do mais, dona Analise é da diretoria da Casa do Radioamador Gaúcho
- CRAG. O casal sempre participa dos congressos e reuniões da
classe. No veraneio, nunca ficam parados. Em Capão da Canoa há o Rádio
Clube. A estação de lá está sempre no ar. Nunca se sabe, os
problemas graves aparecem quando menos se espera.
Assim,
os radioamadores em veraneio se revezam no plantão. Assunto sobre
um casal de radioamador tem demais. Ainda mais se são como Analise
e Walter que combinam até na alta dose de humanismo. No caso de
dona Analise, uma das poucas mulheres no radioamadorismo, dá para
lembrar aquele filme francês e dizer “se todas as mulheres do
mundo fossem...”.
OBS.:
Matéria publicada no Jornal FOLHA DA MANHÃ, página 34, de 12 DE
MARÇO DE 1970.
....
.
... |
Colaboração: IVAN
DORNELES RODRIGUES - PY3IDR |
email:
ivanr@cpovo.net |
.. |
|